quinta-feira, 11 de junho de 2020

Responsório de Santo António

Santo António. Escultura em madeira, estofada, dourada e policromada. Séc. XVIII. Autor desconhecido. A peça foi mostrada em 3 exposições (1992;1993;1994). - Museu Nacional de Arte Antiga. MatrizNet

Quem milagres quer achar / Contra males e o demónio, / Busque logo a Santo António, / Que aí os há-de encontrar. 
Aplaca a fúria do mar, / Tira os presos da prisão, / Ao doente torna são, / E o perdido faz achar.  

Responsório de Santo António. Texto de Julieta Ferrão. Modas e Bordados nº 1741, de 20 de Junho de 1945, pág. 2.

E sem respeitar os anos, / Socorre a qualquer idade; / Abonem esta verdade / Os cidadãos paduanos.
Glória eterna dada seja / À Santíssima Trindade, / Por toda a eternidade; / Minha alma assim o deseja. 
- Orai por nós, bem aventurado António.
- Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

O perdido faz achar?... Vamos, leitora amiga, não sente necessidade de repetir o Responso a Santo António, tanto mais que estamos no mês em que a súplica deve ser mais eficaz? Vamos pedir, pedir muito para que, no meio desta barafunda, possamos encontrar o perdido: o bom senso... o sentido das proporções... o equilíbrio... a equidade... o tempo perdido, de forma a alcançarmos disciplina nos espíritos, nas almas, nas coisas e até no espaço?
Nunca a confusão foi tão confusa! Já reparou no ar apressado, inquietante, agitado do nosso semelhante? Devemos confessar que não é só o semelhante, somos nós próprios, que andamos a correr, a atropelar numa carreira vertiginosa, para chegarmos depressa. Aonde? Não sei. Só verifico que nos esfalfamos, e, ao terminar o dia, quando pretendemos dar balanço ao aproveitamento da energia despendida, chegamos à conclusão de que nada fizemos e de que não nos chegou o tempo para coisa alguma! E, contudo, não parámos!
Desconfio de que o dia já não tem as 24 horas, a hora os sessenta minutos e o minuto os sessenta segundos que, ao iniciar os estudos, me afirmaram ter. Terá o tempo sido vítima de racionamento?
(...)
Mas... já acabou o dia? a semana? o mês? o ano? Mas... ontem não foi dia 1? O quê hoje já são 30? Mas, Santo António, em que foi que perdi o tempo?
Eu sei já não nos ser possível organizar programas pelo menos com intenção de os cumprir integralmente. A vida, hoje, é cheia de surpresas, de imprevistos, e estes é que contam. Mas, para os receber com espontaneidade tem que haver tempo. Tempo? Não, decididamente, o tempo foi alterado. Houve racionamento e não demos por ele. Só lhe damos pela falta...
Santo António valei-nos! (...)
Maio, 1945
Julieta Ferrão 


No mês de Santo António, transcrevo parte do texto da autoria de Julieta Ferrão, publicado em 1945 (Modas e Bordados nº 1741, de 20 de Junho, 1945 - pág. 2). 
Decorridos 75 anos  sobre a publicação deste texto, o seu conteúdo mantém-se actual.


Igreja de Santo António. Inauguração do Museu Antoniano, em !3/06/1962. Negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, formato 9x12. Na foto, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa (António Vitorino França Borges) e Julieta Ferrão. Fotógrafo, Armando Maia Serôdio (1907-1978). - Arquivo Municipal de Lisboa


Julieta Bárbara Ferrão, nasceu em Lisboa (1899 - 1974 ). Foi historiadora e critica de arte. Estudou na Escola de Belas Artes, em Lisboa. No ano de 1927, assumiu o cargo de directora-conservadora do Museu Rafael Bordalo Pinheiro. A sensibilidade e a dedicação de Julieta Ferrão, foram importantes na divulgação e desenvolvimento do Museu e obra de Bordalo Pinheiro. Durante a primeira metade do século XX, foi Conservadora-Chefe dos Museus Municipais de Lisboa.
Santo António, Cónego Regrante de Santo Agostinho Escultura em madeira policromada. Séc. XIX. Autor desconhecido. A peça de Santo António Cónego Regrante de Santo Agostinho foi mostrada em 2 exposições (1995;2014). Museu de Aveiro. MatrizNet
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Dinamizou a organização de várias exposições sobre Lisboa, entre elas “Santo António de Lisboa”, em 1935,  “Aqueduto das Águas Livres”, em 1940, e “Lisboa Joanina”, em 1950. Colaborou com os jornais Diário de Notícias, O Século, Modas e Bordados, entre outros. Escreveu diversas obras sobre a vida e obra de Rafael Bordalo Pinheiro
Julieta Ferrão recebeu a medalha de prata, em 1954. Dez anos depois, no dia 24 de Outubro de 1964, recebeu a medalha de ouro por assiduidade e bons serviços prestados durante quarenta anos à Câmara Municipal de Lisboa. 
Quatro anos após a sua morte, em 1978, o seu nome ficou perpetuado numa rua, em Lisboa.

Fontes:
https://maislisboa.fcsh.unl.pt/julieta-barbara-ferrao-uma-marca-dos-museus-de-lisboa/
https://de.wikipedia.org/wiki/Julieta_Ferr%C3%A3o
http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/

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