sábado, 13 de junho de 2020

Santos Populares em Lisboa


Programa das Festas de Lisboa, 1934. Autor: Almada Negreiros - Almada Negreiros - (França, José Augusto (1974), Almada o Português sem Mestre. Lisboa: Estúdios Cor).  

 - 

Em Lisboa, as festas que no mês de Junho se dedicam a Santo António, São João e São Pedro, são de especial regozijo da população, em especial as dedicadas a Santo António. A devoção dos lisboetas por Santo António, nascido em Lisboa, é secular. Este Santo, muito humanizado por tradição, é invocado  pelos marinheiros em momentos de aflição, chamado para proteger as raparigas,  convocado nos objectos perdidos... 




Santo António de Lisboa. Estampa religiosa.  Litografia colorida. (entre 1840 e 1936?). Biblioteca Nacional de Portugal - BNP. 

Foi nos anos 30 do século XX, que Leitão de Barros, organizou as Marchas Populares, e fomentou concursos de tronos e de janelas enfeitadas. Os tronos, executados por crianças dos bairros antigos de Lisboa, exibiam a imagem de Santo António colocada no topo. A quem passava, as crianças pediam "um tostãozinho para o Santo António". Vem o costume, segundo se diz, do peditório que em toda a cidade se fez, por altura do terramoto de 1755, para ajudar na reconstrução da sua igreja. 

A tradição dos tronos continua a merecer a atenção popular.  Este ano (2020), a sexta edição é digital.



Festas de Santo António
. Crianças preparam o trono e o peditório. Data: Junho de 1909. Fotógrafo: Joshua Benoliel (1873-1932). Negativo de gelatina e prata em vidro. - Arquivo Municipal de Lisboa.


Trono de Santo António.
Largo de São Miguel. Foto "comjeitoearte" (2019).

Alfama é o lugar de excelência nas festividades e na alegria dos arraiais. O cheiro a manjerico – com cravo de papel e quadra – e a sardinha assada, percorre os becos, vielas e escadinhas dos bairros de Lisboa durante os festejos.

Nos anos 50 do século XX, os mais célebres Arraiais de Santo António, foram organizados na Praça da Figueira. 


Santos Populares
, arraial. Data: Entre 1950 e 1970. Ferrari, Amadeu (1909-1984), fotógrafo. Negativo cromogéneo em acetato de celulose. Arquivo Municipal de Lisboa

.


Arraial, decoração . Rua de São Miguel. Foto "comjeitoearte" (2019).



As primeiras marchas populares oficiais, organizadas de acordo com um plano artístico de conjunto, foram as apresentadas nas Festas da Cidade, em 1934. O programa das festas, teve ilustrações de Almada Negreiros. 


Programa das 
Festas de Lisboa, 1934. Autor: Almada Negreiros


Festas da Cidade ,1934. Vários aspectos das marchas populares nocturnas, e do fogo de artifício queimado no Tejo. Ao alto da página vemos uma fotografia do Terreiro do Paço, onde se efectuou o Arraial e a Feira, vendo-se a estátua de D. José e o Arco da Rua Augusta profusamente iluminado. - Ilustração nº 204, de 16 de Junho de 1934, pág. 19. - Hemeroteca Municipal de Lisboa



No ano de 1950, foram organizadas onze marchas populares. O desfile realizou-se no dia 12 de Junho, à noite, entre a Praça do Comércio e a Avenida Fontes Pereira de Melo. Nos dias 23 e 28 de Junho, à noite, as marchas apresentaram-se a concurso no Pavilhão dos Desportos.



A marcha da Madragoa.
1º prémio de classificação geral e de pitoresco. 
Data: 1950. Fotógrafo: Joshua Benoliel (1873-1932). Negativo de gelatina e prata em nitrato de celulose. Madragoa participou em 1932, com excepção de 1981, e colaborou todos os anos nos Festejos dos Santos Populares. A sua primeira organização foi da responsabilidade de um Comissário Local, assim como, em 1934 e 35. O seu figurino feminino são as Varinas. - Arquivo Municipal de Lisboa..




A marcha de Alfama
. 1º prémio de tradição e 3º prémio de classificação geral. 
Data: 19. Fotógrafo: Joshua Benoliel (1873-1932). Negativo de gelatina e prata em nitrato de celulose. - Arquivo Municipal de Lisboa.


As marchas populares que sempre constituíram um espectáculo colorido e cheio de vida, são muito aplaudidas e acarinhadas pela população. 


Mouraria, marchas e arraiais dos Santos Populares. Local: Chão da Feira. Data: 12 -06-2019. Fotógrafo: Luís Pavão.1954-.Suporte Digital TIFF. - Arquivo Municipal de Lisboa.


Fontes:


https://egeac.pt/concurso-tronos-de-santo-antonio20/

http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/

http://www.bnportugal.gov.pt/

http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/OBRAS/RevMunicipal/N45/N45_item1/P4.htm

quinta-feira, 11 de junho de 2020

Responsório de Santo António

Santo António. Escultura em madeira, estofada, dourada e policromada. Séc. XVIII. Autor desconhecido. A peça foi mostrada em 3 exposições (1992;1993;1994). - Museu Nacional de Arte Antiga. MatrizNet

Quem milagres quer achar / Contra males e o demónio, / Busque logo a Santo António, / Que aí os há-de encontrar. 
Aplaca a fúria do mar, / Tira os presos da prisão, / Ao doente torna são, / E o perdido faz achar.  

Responsório de Santo António. Texto de Julieta Ferrão. Modas e Bordados nº 1741, de 20 de Junho de 1945, pág. 2.

E sem respeitar os anos, / Socorre a qualquer idade; / Abonem esta verdade / Os cidadãos paduanos.
Glória eterna dada seja / À Santíssima Trindade, / Por toda a eternidade; / Minha alma assim o deseja. 
- Orai por nós, bem aventurado António.
- Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

O perdido faz achar?... Vamos, leitora amiga, não sente necessidade de repetir o Responso a Santo António, tanto mais que estamos no mês em que a súplica deve ser mais eficaz? Vamos pedir, pedir muito para que, no meio desta barafunda, possamos encontrar o perdido: o bom senso... o sentido das proporções... o equilíbrio... a equidade... o tempo perdido, de forma a alcançarmos disciplina nos espíritos, nas almas, nas coisas e até no espaço?
Nunca a confusão foi tão confusa! Já reparou no ar apressado, inquietante, agitado do nosso semelhante? Devemos confessar que não é só o semelhante, somos nós próprios, que andamos a correr, a atropelar numa carreira vertiginosa, para chegarmos depressa. Aonde? Não sei. Só verifico que nos esfalfamos, e, ao terminar o dia, quando pretendemos dar balanço ao aproveitamento da energia despendida, chegamos à conclusão de que nada fizemos e de que não nos chegou o tempo para coisa alguma! E, contudo, não parámos!
Desconfio de que o dia já não tem as 24 horas, a hora os sessenta minutos e o minuto os sessenta segundos que, ao iniciar os estudos, me afirmaram ter. Terá o tempo sido vítima de racionamento?
(...)
Mas... já acabou o dia? a semana? o mês? o ano? Mas... ontem não foi dia 1? O quê hoje já são 30? Mas, Santo António, em que foi que perdi o tempo?
Eu sei já não nos ser possível organizar programas pelo menos com intenção de os cumprir integralmente. A vida, hoje, é cheia de surpresas, de imprevistos, e estes é que contam. Mas, para os receber com espontaneidade tem que haver tempo. Tempo? Não, decididamente, o tempo foi alterado. Houve racionamento e não demos por ele. Só lhe damos pela falta...
Santo António valei-nos! (...)
Maio, 1945
Julieta Ferrão 


No mês de Santo António, transcrevo parte do texto da autoria de Julieta Ferrão, publicado em 1945 (Modas e Bordados nº 1741, de 20 de Junho, 1945 - pág. 2). 
Decorridos 75 anos  sobre a publicação deste texto, o seu conteúdo mantém-se actual.


Igreja de Santo António. Inauguração do Museu Antoniano, em !3/06/1962. Negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, formato 9x12. Na foto, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa (António Vitorino França Borges) e Julieta Ferrão. Fotógrafo, Armando Maia Serôdio (1907-1978). - Arquivo Municipal de Lisboa


Julieta Bárbara Ferrão, nasceu em Lisboa (1899 - 1974 ). Foi historiadora e critica de arte. Estudou na Escola de Belas Artes, em Lisboa. No ano de 1927, assumiu o cargo de directora-conservadora do Museu Rafael Bordalo Pinheiro. A sensibilidade e a dedicação de Julieta Ferrão, foram importantes na divulgação e desenvolvimento do Museu e obra de Bordalo Pinheiro. Durante a primeira metade do século XX, foi Conservadora-Chefe dos Museus Municipais de Lisboa.
Santo António, Cónego Regrante de Santo Agostinho Escultura em madeira policromada. Séc. XIX. Autor desconhecido. A peça de Santo António Cónego Regrante de Santo Agostinho foi mostrada em 2 exposições (1995;2014). Museu de Aveiro. MatrizNet
.

Dinamizou a organização de várias exposições sobre Lisboa, entre elas “Santo António de Lisboa”, em 1935,  “Aqueduto das Águas Livres”, em 1940, e “Lisboa Joanina”, em 1950. Colaborou com os jornais Diário de Notícias, O Século, Modas e Bordados, entre outros. Escreveu diversas obras sobre a vida e obra de Rafael Bordalo Pinheiro
Julieta Ferrão recebeu a medalha de prata, em 1954. Dez anos depois, no dia 24 de Outubro de 1964, recebeu a medalha de ouro por assiduidade e bons serviços prestados durante quarenta anos à Câmara Municipal de Lisboa. 
Quatro anos após a sua morte, em 1978, o seu nome ficou perpetuado numa rua, em Lisboa.

Fontes:
https://maislisboa.fcsh.unl.pt/julieta-barbara-ferrao-uma-marca-dos-museus-de-lisboa/
https://de.wikipedia.org/wiki/Julieta_Ferr%C3%A3o
http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/